INOVAÇÃO NO USO DO VERBO “DESAPARECER” NA CPI DE DESAPARECIMENTO DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES: MOTIVAÇÕES PRAGMÁTICO-DISCURSIVAS PARA NOVOS USOS LINGUÍSTICOS | Autores: Dioney Moreira Gomes (UNB - Universidade de Brasília) ; Tiago Rodrigues (UNB - Universidade de Brasília) |
Resumo: Este trabalho analisa os diferentes usos do verbo “desparecer” em depoimentos da Comissão Parlamentar de Inquérito da Câmara dos Deputados que investigou o desaparecimento de crianças e adolescentes no Brasil (2009-2010). O objetivo é compreender as motivações semânticas, pragmáticas e discursivas para o verbo “desaparecer” ter sido empregado em três contextos sintáticos distintos. O primeiro, mais prototípico, com um único participante na voz ativa, como em “[…] as crianças não querem participar da presença na sua família e, portanto, desaparecem”. O segundo, já registrado na literatura como corrente no Brasil, com dois participantes, como em “Quem desapareceu com essas crianças?”. E o terceiro, um uso inovador, com um único participante na voz passiva, como em “1.257 crianças e adolescentes foram desaparecidos nos últimos 9 anos”. A análise está assentada nos pressupostos teórico-metodológicos da Linguística Cognitivo-Funcional (LCF), que entende a língua como mosaico complexo de atividades cognitivas e sociocomunicativas, reconhecendo o estatuto fundamental das funções da língua na investigação das suas formas (FURTADO DA CUNHA, 2015). Os resultados da pesquisa evidenciam que o número de participantes em torno dos verbos é constantemente ressignificado com base nas necessidades discurso-pragmáticas dos falantes. Essa conclusão evidencia um forte vínculo entre a experiência de mundo do falante e a cognição, o que reforça a necessidade de categorias linguísticas (como valência, estrutura argumental, frames, contexto, topicalização, etc.) serem pesquisadas em contextos reais de uso. A identificação da voz passiva com o verbo “desaparecer”, por exemplo, que é tipificado como intransitivo ou transitivo indireto apenas, permite também criticar o ensino de categorias linguísticas estanques praticado nas escolas brasileiras. As necessidades e intenções dos falantes são relevantes na determinação de um uso verbal. A pragmática e o discurso podem levar um grupo de falantes a produzir uma inovação linguística, como o uso de “desaparecer” na voz passiva.
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