Elaboração e reconhecimento em Caderno de memórias coloniais
| Autores: Vima Lia de Rossi Martin (USP - Universidade de São Paulo) |
Resumo: O trabalho busca, a partir da análise do romance autobiográfico Caderno de memórias coloniais, publicado em 2009 por Isabela Figueiredo, investigar de que modo a narradora reconstrói discursivamente a memória de sua infância, que articula história pessoal e a experiência coletiva do colonialismo em Moçambique nos anos que antecedem a independência, conquistada apenas em 1975. O romance, construído por cinquenta e um capítulos curtos, tem caráter ensaístico e testemunhal, e provocou um intenso debate em Portugal por ocasião de sua publicação. Valendo-se de estratégias como a elipse e a ironia, e dando destaque à materialidade do corpo negro - em oposição à do corpo branco - a autora elabora e reconhece aspectos constitutivos de sua identidade, fundada sobretudo na relação ambivalente estabelecida com o pai. Este, homem de corpo e personalidade fortes, agente do racismo e da violência que caracterizam a realidade colonial, é simultaneamente adorado e odiado pela menina - filha única que, aos poucos, descortina a crueldade do sistema católico e patriarcal no qual está inserida. Nesse sentido, o corajoso relato autobiográfico empreendido por Isabela Figueiredo configura-se simultaneamente como uma luta íntima e um compromisso ético, desafiando a complexa dinâmica estabelecida entre lembrar e esquecer, entre denunciar e silenciar.
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