O trabalho pretende refletir sobre a tensa relação entre imprensa e literatura a partir do estudo da gênese textual e crítica literária dos Retalhos, conjunto de cadernos com recortes de jornais e anotações manuscritas do escritor Afonso Henriques de Lima Barreto (1881-1992), arquivados na Seção de Manuscritos da Biblioteca Nacional. Para a abordagem desse material partimos da premissa de que se trata de um arquivo pessoal do escritor onde pulsa uma espécie de oficina de escrita caracterizada pelos imbricamentos entre os aspectos da gênese de suas obras e as intervenções da história e cultura. Local, portanto, de cruzamento entre a criação e a vida literária, sem a sequência cronológica, mas com rica contextualização acerca da recepção das obras e da participação do escritor nos debates da época. Articular os recortes de jornais às reflexões do escritor sobre a imprensa, sua relação com a literatura e vida literária permitirá mostrar a simultaneidade entre: a) a atuação crítica e intensa nos periódicos, do início do século XX diante dos dilemas culturais; b) a utilização dos recortes de jornais como parte do processo de criação literária e de constituição de sua persona literária. Entre os possíveis resultados dessa pesquisa, encontra-se a possibilidade de rever os conceitos sobre a produção do escritor e reconfigurar algumas de suas obras, entre elas destaca-se o Diário Íntimo. Podemos lê-lo não mais como o diário de um escritor, na perspectiva clássica de definição de um diário, mas como documento de gênese. Outro aspecto significativo é a constatação dos efeitos da afirmativa: “Lima Barreto, colecionador de retalhos”, para os estudos literários e crítica cultural.