Autores: Adriana Carvalho Lopes (UFRRJ) e Daniel do Nascimento e Silva (UFSC)
Este artigo busca retirar o debate sobre o ensino de língua materna do campo da natureza e inseri-lo no campo da política. Influenciados por abordagens translingues no ensino de língua propostas por pesquisadores/as em contextos norte-americanos, elaboramos um curso de ensino de língua materna para uma turma de licenciatura em letras de uma universidade pública. Composto por estudantes/formandas, tal curso buscou problematizar ideologias linguísticas, já que essas são construções políticas sujeitas aos interesses dos grupos sociais que as sustentam. Ao final do semestre, após discussão de autores pós-coloniais, passando pelo debate da antropologia linguística e pela escuta de práticas linguísticas de fronteira, promovemos um diálogo sobre o poema Trinticuatro escrito em Portunhol pelo escritor, Fabian Severo, nascido na fronteira entre Brasil e Uruguai. Após a escuta do poema, em que o escritor explora ideologias linguísticas em conflito, as estudantes enunciaram suas próprias ideologias linguísticas constituídas por suas experiências e saberes locais. De um lado, estudantes reforçavam a língua padrão como uma métrica por meio da qual se classificam a língua, os valores e as identidades dos falantes. De outro, traziam ideologias linguísticas que desafiam a imaginação sobre padronização da língua. Correlacionando sistema linguístico à sistema social, estudantes destacaram que as formas linguísticas andam lado a lado com formas de pertencimento racial e social. Concluímos este trabalho, apontando que o curso colocou-se como uma tentativa de criar com as futuras professoras uma abertura à diferença no ensino e no entendimento dos usos a língua; uma abertura que é uma prática utópica de resistência à homogeneização e à exclusão de estudantes que não se enquadram nos padrões linguísticos hegemônicos que apontam para as desigualdade de classe, de gênero e de pertencimento étnico.