No contexto brasileiro, as trajetórias dos intelectuais negros demonstram o quão profícua tem sido a produção do conhecimento, no campo das ciências humanas, orientada por um pensamento crítico que esboça diferentes perspectivas de construção de outra geografia da razão. Este trabalho pretende mostrar aspectos das trajetórias intelectuais de Lélia Gonzalez, Beatriz Nascimento e Conceição Evaristo que contribuem para responder a permanente exclusão histórica que o pensamento de mulheres negras e intelectuais ainda enfrenta na sociedade brasileira. É objetivo do trabalho também compreender como o conceito de “escrevivência”, cunhado por Evaristo, alicerça o trabalho das intelectuais mencionadas, visando o exercício prático da literatura a partir de uma perspectiva interdisciplinar. Gonzalez, Nascimento e Evaristo fazem parte de uma geração de mulheres que enfrentaram práticas de violência e opressão cotidianas, através dos embates de natureza variada com os diversos segmentos de poder no Brasil. Lélia Gonzalez desenhou traços de uma antropologia social, cujas referências endossam a humanidade negra através e principalmente do feminismo afrolatinoamericano. Beatriz Nascimento compreendeu a experiência quilombola como possibilidade de recuperação da identidade negra, de busca por um território, onde homens e mulheres não se reconheçam como propriedade, e, sim, como seres humanos. Já Conceição Evaristo trilhou o caminho da poesia e da ficção, fazendo com que seus textos se tornassem um ethos da produção literária negra e feminina, trazendo para o centro dos questionamentos sociais e políticos os dilemas do sujeito negro, com particular enfoque à condição humana das mulheres negras. Lélia Gonzalez, Beatriz Nascimento e Conceição Evaristo compartilharam problemas semelhantes que envolvem as clivagens de raça, gênero e classe social e que dizem respeito, não só ao empoderamento das individualidades negras femininas, mas também a libertação do humano como condição necessária aos desdobramentos, sentidos e efeitos que a construção do conhecimento implica para o passado, presente e futuro.