O objetivo deste trabalho é descrever a modificação realizada por ‘pouco’ em sintagmas nominais. A interpretação é sempre a mesma: (1) ‘Eu como pouco chocolate’ _interpretação: “o grau de quantidade de chocolate que consumo está abaixo do parâmetro”; (2) ‘Fez pouco frio hoje’ _interpretação: “o grau de frio que fez hoje está abaixo do grau do parâmetro”.
‘Pouco’ sempre introduz uma comparação de inferioridade, em que um dos termos de comparação não é pronunciado. Quando o nome é de propriedade graduável, ‘pouco’ reduz o grau de intensidade (em ‘Fez pouco calor hoje’, ‘pouco’ reduz a intensidade do calor). Quando o nome não é graduável, ‘pouco’ opera sobre a dimensão da quantidade: volume ou cardinalidade (‘Chegaram poucas pessoas’= chegaram menos pessoas que o esperado). Em contextos com leitura cardinal de exatamente n, ‘pouco’ é inaceitável: ‘Maria trouxe o (*pouco) irmão dela’. Nossa hipótese é que exatamente n é uma escala fechada, e comparações de inferioridade são escalas abertas.
No estudo dos dados coletados em jornais foram realizadas a classificação dos nomes em intensificacionais ou de quantidade, com testes de gramaticalidade e de valor de verdade, segundo a intuição do falante; a transposição de características das escalas de Kennedy & McNally (2005) para o domínio nominal; e, a classificação dos nomes segundo as características massivo-contável-flexível-falso massivo (Barner & Snedeker 2005).
Com base nas hipóteses, foi previsto que ‘pouco’ modificaria todos os nomes que apresentassem escalas abertas (volume e cardinalidade vaga), por expressarem um grau não-máximo; e não modificaria SDs contendo nomes contáveis com leitura de cardinalidade exata.
A análise de dados comprova a hipótese: ‘pouco’ introduz uma escala aberta, uma comparativa de inferioridade. Foi confirmado que ‘pouco’ realiza a mesma operação no domínio verbal, adjetival e nominal, o que permite tratar ‘pouco’ como um modificador de grau que não faz seleção categorial, mas semântica.